Acordou. O ato de acordar
era tudo o que tinha naquele momento, apenas deixou que o simples exercício de
abrir os olhos a consumisse. Não queria estar acordada, nem queria fazer parte
daquele mundo disforme, não mais. Aos poucos começou a perceber que os raios do
sol entrevam e vagavam sem rumo pelo interior de seu quarto. O que era o sol?
Pegou-se pensando a respeito por míseros minutos. Naquele momento nem se dava conta de quem
era, imagine só se saberia o que ele era?
Mera perda de tempo!
Aos poucos mexia-se,
sentido seu corpo levemente despertando, despertando de algo que nem sabia o
que era. Não se lembrava de ter dormido; e agora estava acordando e dando
início ao que parecia ser um novo dia. Dias? Eles passaram e ela nem ao menos
os sentiu, não sabia que gosto tinha. Apenas os viveu como os vive uma pedra
qualquer. Tudo naquele momento não fazia sentido, como não tinha feito nos
últimos anos.
Olhou no relógio de parede
e já passava das dez. E o que importava? O tempo nunca guiou sua alma, apenas
aprisionou sua sensatez. Começou a sentir os dedos do pé formigarem; dizem
que quando isso ocorre é por manter-se tempo demais em uma mesma posição. Isso
lhe fez pensar que não se dera conta de quanto tempo permaneceu ali naquela
posição. Não tinha lembrança nem de quando ali se deitou; então quem dirá o
tempo que permaneceu?
Ao despertar, sentia falta
de estar dormindo, e quando estava dormindo necessitava acordar. Essa sensação
tão vaga muitas vezes lhe vinha em sonhos; não a compreendia, apenas tinha a
certeza de que a sentia e como sentia, não sabia. Não era algo que algum dia
importou-se.
Mexeu os pés e,
instantaneamente, percebeu que eles ainda respondiam aos seus comandos. Teve
vontade de levá-los ao chão; vontade essa que logo se consumou. Sentiu o chão
frio tocar-lhe e essa sensação por mais vazia que pareça foi boa. Parece que o
frio lancinante que veio de baixo tocou fundo o gélido de sua alma e os dois
conduziram uma dançae m seu interior. Agora me sentia-se completa.
Postou-se de pé e descalça
permaneceu. Precisava suportar esse frio que me lhe fazia tão bem, queria
senti-lo de perto. Não queria deixá-lo ir embora. Não podia! Nunca tinha
sentindo sentimento algum por nada e agora se sentia atraída por ele. Teve
vontade de deitar-se sobre o chão. E fez. Debruçada sobre ele, abraçou-o firme.
Usou toda sua força, não queria desgrudar dali nunca mais. Aquele universo
particular era seu e só seu. Não deixaria que ninguém e nem algo lhe tirasse.
Ali permaneceu por segundos... por minutos... ou, talvez, por horas.
Entrou-lhe, conheceu seu lado frio; e desse, ela gostava. Era esse seu lado que
sempre procurava e estava satisfeita em tê-lo encontrado. Agora sentia os
icebergs que haviam se formado em sua alma há tempos.Sentia-os como agulhas
gélidas lhe martirizando; gostava dessa sensação, gostava do tormento causado.
Sentia que sua face esfriava, congelando-se em contado com o chão. E isso a
ligava ao solo, parecia que estava conectada a terra. Podia ouvir os barulhos,
ou seria batimentos? Era um ventre? Acreditava ter atingido o ventre da terra.
O que tem lá? Já ouvi dizer que é de lá que brota a vida. Vida? Sobre isso não
podia mais falar, porque não mais a compreendia.