Sabe o que está por detrás
das cortinas. Ele tem o roteiro da peça. Cada fala, cada gesto, cada expressão,
são coordenados pelos seus atos. Todas as vestes são costuradas pelos pontos
tecidos de suas mãos, é dele o último nó, as linhas, os fios, trançados
fielmente entre seus dedos. Mãos que fazem roteiros, comédias, tragédias,
dramas. À parte do destino e tão dono dele.
Tudo seu, todos, o todo, de um tudo. Gigante em fazeres, hábil
costureiro de vidas, pescador maestro, em sua rede fisga os melhores.
Carpinteiro por excelência, através de suas ferramentas vem ao mundo as
melhores esculturas, corta os defeitos, arranca pontas, serra o lado estragado,
aprega os anexos, lixa a pele grosseira, pinta com o melhor tom, por fim, deita
uma camada fina de verniz, para proteger dos tempo ruins. Escultor das melhores
peças, aperta, comprimi, tira o excesso, molda dali, daqui, molha, modela, leva
à queima. Pronta para o uso, uma nova existência, um novo ser, uma nova razão.
Mais um aqui, mais um vindo, outro indo, um caindo, outro nascendo, seguindo o
ritmo, novos e velhos, a roda girando, nascendo, vivendo, morrendo.
É dono daquilo, sabe tudo
o que acontece. Afinal, os atos são vistos pelos seus olhos, só ele pode contar
a verdadeira história. Se algum dia se calar, quem saberá? Uma história pode
ser contada por muitos, mas só o dono dela é quem dentem a verdade. Como dono
de tudo aquilo, sabe que todos os atos são planejados pelos roteiros que ele
mesmo escreve, os perfis são todos traçados pelo que ele acha ideal. Forja
falas, constrói diálogos, planeja conversas, tira uma palavra daqui, põe ali,
não aqui, mais ao meio, espera, mais ao fim é melhor. Todas as palavras têm
significados que são seus, dono de toda a semântica-existência, significando à
medida que promove sentidos, sentindo o sentido, sentido-sentimento.
Tudo reflete apenas o que
pensa, os seus pensamentos são os pensamentos do rei. No tabuleiro ele é a
rainha e os peões. Quem dá as coordenadas é ele, subordinados são os menores,
não inferiores menores em ordem. Há hierarquia de poder para o que é vivo,
tentar omita-la é uma farsa. Impõe ordens, mandou ontem, mandou agora e
continuará a mandar mais tarde, mandamentos a todo o momento. Saia daqui, vá
para lá, continua andando, não fale, não cale, olhe para mim, não faça isso,
suma da minha frente, não diga o meu nome, não dê ordens a quem é Rei!
Toda razão é sua; sabe
quando mover os ponteiros. Todos os instantes estão sobre o seu controle - sem
ele – não se movem mais; conservavam-se intactos. Pelas suas veias passam o
tempo, a todo tempo, não o tempo dos homens, o tempo distinto da realidade, o
tempo a quem ninguém controla, o de agora, o tempo de todo o tempo. Os
instantes forjados a cada instante, instantâneos a cada segundo, rápidos,
ligeiros, movendo ciclicamente, caminhando nessa e naquela direção. Perpassando
os movimentos, os jogos, os ventos, os tormentos. Apressando os passos, cada
pegada um instante arrancado, cada instante um pé a frente e outro atrás, um a
frente e outro indo. Guiando os passos, é dono deles, de cada um deles, ele tem
pés, os meus pés, os seus também, de todos nós. Não caminhem rápido com pés que
não são seus, os pés é dele, pensa que pisas onde é de vontade? Calculado está
cada passo seu.
São os seus anseios que
movem os impulsos, ele os tem. Tudo que se sente é sentido primeiro, sentindo
primeiro por ele, o sentimento primordial, o inicio do sentir, todo o início é
dele. Os sentimentos são ele, sentir ele, sentir nele, sentindo com ele,
sentidos para ele, sentimentos em torno dele, sinta com ele, sinta com você,
você sinta. Sinta tudo. O coração sente ele, o que vem do coração vem dele, o
coração é dele, não, o coração é ele. Todo o amor vem do coração, o amor de
coração, coroar a ação, cora a ação. O medo de dentro, o medo dele, o daqui, o
medo de mim, o medo de tudo, o medo também é dele, todo o medo de tudo, o medo
do mundo, o medo do escuro. O medo vai fundo, fundo a ele, o fundo dele, fundir
com ele, fundindo medos, fundindo sentimentos, juntando tudo, colocando tudo no
mesmo, costurando junto. Sentindo a tudo, sentindo tudo nele, é sentido, sentido
dele.
O todo faz parte do seu
universo, em cada instante. As coisas vem à ele e depois voltam. Como vem é
segredo, como voltam é mistério. Voltando sempre ao seu pedido, pedido
atendido, vindo e rindo, seguindo e indo. Voltando agora que é pedido. Peça
agora, venha nessa hora. Peça que venha embora, volte outrora. Tudo é hora,
hora de voltar. Voltar para o agora, deixa embora. Não toque agora, a hora não
importa, tranque a porta. Não deixe passar a porta, deixe ele voltar de volta.
Voltar no agora, ele detém o agora. Tudo tem hora, hora de partir, hora de ir,
hora de seguir, hora de parar, hora de pensar, hora de retornar, hora de
voltar. Feitos em hora, de sua memória, de seu relógio. Seus ponteiros é que dá
a hora, não olhe lá fora, já não é hora. Não sabe o momento dele, mas ele sabe
a que hora é hora. Tudo de hora em hora, em suas horas, voltando para o seu
agora. Controlando tudo, instantes, segundos, minutos, horas, sem enrola.
E é isso que faz dele
forte: é totalmente mutável, as coisas lhe cabem. Muda sempre, sempre mudando,
acompanhando mudanças no mundo afora. Tudo em que toca muda, mudando sempre as
coisas ao toque, a cada toque um desfoque, desfocando imagens, perfis, corpos,
rostos, membros. Promovendo mudanças, trocando os lados, invertendo os eixos,
solvendo aqui e pitando ali, desenhando o modelo agora de uma forma, apagando a
gosto, à frente riscando o que lhe importa. Tudo molda, tudo faz, faz igual,
faz diferente, mas faz sempre, aquilo que faz é um tipo, é um tipo diferente,
mas é igual, é oposto e diferente, parecido e semelhante. A criação do
diferente, criando em mente, criando na mente, criando mentes, criando o que
não se mente. Criando a quem vê crente. Tudo rente, linear, perfeito, bem
feito, suas mãos fazem bonito, constroem o que deseja, deseja sempre, desejo em
frente.
Sabe a ordem das coisas e
dos lugares. É sobre os seus braços que todos dormem. Sabe o passo que conduz a
dança. Tem tudo e todos são seus. Controla as cordas do boneco, dá voz ao
ser-ventrículo. É sua voz, fala o que deseja, fala nomes, objetos, desejos,
insultos, títulos. Designa palavras a seres. Nomeando os seus, nomeia cabeças,
nome em cabeças, cabeças com nomes. Abraçando tudo, com o braço controlando,
cantarolando, com o canto da mente. Caminhando entre ruas e estradas, cada
passada nomes deixados, títulos lançados, traçando dizeres, rogando expressões
em prazeres. O que tem feito é criar, criando feitos, criando perfeito, criação
de tudo, criando o mundo. O tudo. O todo. Tudo forjando, modelando lugares,
pessoas, caminhos, destinos, tranças de vidas, de existências. Fios de mente,
tecendo a vida, amarrando todos. O universo é seu, ele é o universo, universalizando
tudo.
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