Perguntou.
─ Ele sentirá?
─ É o quê, menina?
A garota apontou para a
barriga.
─ Não, ainda nem é gente.
─ respondeu a velha, balançando a cabeça.
─ E eu?
─ Agora é tarde para
perguntas. ─ Adiantou à moça um copo de barro suado, cheio de chá escuro. ─
Agora beba, sentirá um amargo, não pare, beba tudo.
A jovem fechou os olhos e
apenas engoliu a bebida escura. Um misto de amargo e salgado desceu-lhe a
garganta, a temperatura elevada da bebida ao tocar sua boca lhe fez tossir duas
ou três vezes. Após ingerir tudo, encolheu-se sobre a esteira e lágrimas
banharam seu rosto. Sentiu-se ruim e sua cabeça dava voltas, deitou e fechou os
olhos. Morta, pensou. Ao mexer os dedos
dos pés, concluiu que não. Imaginou como seria a vida de mãe, apalpou a
barriga. O que tinha feito? Embora não tivesse certa consciência, sabia que o
que acabara de fazer lhe custaria dias, ou talvez meses de sono. Voltou-se à
velha, que calmamente arrumava seus vidros de ervas sobre as prateleiras acima
do fogão-de-lenha. Parecia tão tranquila com toda aquela situação, que não
demonstrava resignação alguma. Talvez estivesse tão acostumada com as práticas
de ‘tiragem’ que já tivesse pegado gosto pelo ofício.
─ Como me sentirei? ─ quis
saber a moça.
─ Como quem se livrou de
um fardo ─ respondeu sem cerimônias ─ Olhe pra você, uma jovem que nem seios
ainda têm para dar leite. O que teria feito se tivesse o infeliz? Pediria
esmolas para dar-lhe de comer?
A jovem encolheu-se sobre
a esteira. Sentia-se suja em saber que a velha desenhou a verdade diante dos
seus olhos, que trouxe sua cabeça de volta a superfície da realidade.
─ Vá e deixe o combinado
sobre a mesma. E já sabe. Você nunca me viu e jamais entrou nessa casa. Em sete
dias, no máximo, ele descerá, e terá o seu resultado.
Jane levantou-se e sentia
ardências no estômago. Afastou a blusa um pouco de perto do seio, e apanhou um
saco de moedas, tão amassado e sujo quanto sua dignidade estava agora. Fez como
ordenara a velha, deixou sobre a mesa e saiu em passos apressados e jamais
ousou olhar para trás. Caminhou por
algumas horas junto de sua trouxa de roupa, sem saber onde iria passar a noite
dessa vez. Ignorou qualquer pensamento, apenas caminhou e caminhou. Ao longe
ouviu o barulho frenético de rodas riscando a estrada. Ignorou. E nem olhou para trás, mais uma vez. Deve ser
só mais algum miserável bêbado arriscando a vida, concluiu. O barulho aumentou
e chegava-lhe com maior frequência aos ouvidos. Dessa vez decidiu por olhar o
que estava acontecendo. Antes que seus olhos encontrassem o motivo da bagunça,
o miserável bêbado já estava em cima de seu corpo em falência; com sua
carruagem forjada em ferro maciço, amassou-lhe o tronco por completo. A última
imagem que viu foi dos raios solares que lhe queimava o rosto moribundo,
enquanto pessoas descidas da carruagem se aglomeravam ao seu redor para ver a
desgraça recém-armada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário